Um espaço para contribuir com o PT no debate sobre temas da conjuntura.

Sem autoengano, é fundamental reconstruir o PT

Mas Quem é o Partido?

Mas quem é o partido?
Ele fica sentado em uma casa com telefones?
Seus pensamentos são secretos, suas decisões desconhecidas?
Quem é ele? Nós somos ele.
Você, eu, vocês – nós todos.
Ele veste sua roupa, camarada, e pensa com a sua cabeça
Onde moro é a casa dele, e quando você é atacado ele luta.
Mostre-nos o caminho que devemos seguir, e nós
O seguiremos como você, mas
Não siga sem nós o caminho correto
Ele é sem nós
O mais errado.
Não se afaste de nós!
Podemos errar, e você pode ter razão, portanto
Não se afaste de nós!
Que caminho curto é melhor que o longo, ninguém nega
Mas quando alguém conhece
E não é capaz de mostrá-lo a nós, de que nos serve sua sabedoria?
Seja sábio conosco!
Não se afaste de nós!

BERTOLD BRECHT

O PT da Bahia, em 2024, há 18 anos no governo do Estado, elegeu 49 das 417 prefeituras. Governará no executivo municipal para 7,3% do eleitorado do Estado. Nosso principal adversário, que elegeu 38 prefeituras, governará 33,2% do eleitorado do Estado. Na janela eleitoral, o PT já havia aumentado de 32 para 48 prefeituras, com prefeitos que, pela força de atração do governo do Estado e do governo federal, quiseram a legenda do PT. O PT não foi derrotado, mas está longe de superar o ciclo de dificuldades que começou em 2016.

O aumento no número de prefeituras governadas pelo PT e pela base não foi recebido pela militância com gosto de vitória. Há muitos motivos para preocupação em Salvador, com uma derrota acachapante para o governo e para o PT.

O resultado das duas últimas eleições municipais, 2016 e 2020, foi de duras perdas. Em 2016, o PT amargava o golpe imposto a Dilma e sofria o auge do antipetismo. Em 2020, com o bolsonarismo na presidência da República e em plena pandemia, uma segunda derrota. Em 2024, com Lula na presidência e o PT no quinto mandato de governo na Bahia, o resultado pífio, os prejuízos causados pela federação, a ida de petistas que são deputados, deputadas, secretários e secretárias estaduais e do próprio governador para palanques contrários ao PT e diversas vezes contra candidatos/candidatas do PT, a falta de prioridade no fortalecimento do PT compuseram um cenário de muita dificuldade e indignação da base eleitoral petista.

A falta de prioridade que mencionamos acima, para muitos dirigentes, é tratada como prioridade em fortalecer a base aliada. Um equívoco, em nossa opinião, pois a base aliada é o centro que se move de acordo com seus interesses (espúrios na maioria dos casos), enquanto a base petista é aquela comprometida com o nosso projeto. Em muitos locais a direção estadual do PT não atuou para garantir os interesses do PT da Cidade, e o partido foi sacado de última hora de chapas majoritárias, de locais onde tinha força política para disputar.

O papel de Jerônimo nas eleições de 2024 foi divisivo. A gestão pragmática de uma frente exige decisões por vezes desagradáveis, mas ele, especialmente, não poderia, nem deveria subir em palanques contra o PT, sem no mínimo dialogar e estes casos deveriam ser exceções raras. A forma como o triunvirato (Rui, Jerônimo e Wagner) operaram nestas eleições abriu grandes fraturas com a militância mais orgânica do PT e é provável a implosão de vários diretórios estado afora.

Embora tenha aumentado a votação do PT, diminuído a abstenção geral e aumentado o número de prefeituras, o partido perdeu a única grande prefeitura que dirigia, manteve o número de vereadores, mas perdeu 3 dos 4 vereadores da capital. Não é possível, com esses dados, fazer um balanço positivo da realidade. Neste contexto é fundamental ganhar Camaçari com Caetano para fortalecer o projeto petista no Estado. A raiva e a indignação não podem nublar a tarefa central de ganhar Camaçari, tod@s com o PT, tod@s com Caetano.

As análises da esquerda no Brasil apontam um problema grave: o PT e a esquerda não têm conseguido apresentar um projeto, uma narrativa que dispute as consciências brasileiras. O PT, no Brasil, tem apenas Lula nesse momento. Falta, no PT, organização social com força e atuação cotidiana nas periferias. Falta, no discurso político, elementos que apontem para a esperança em dias melhores para o povo. Falta um projeto de desenvolvimento que seja uma alternativa melhor e mais solidária do que o que existe hoje. A narrativa de manutenção do que fizemos nos anos dourados do nosso governo é insuficiente para convencer a maioria da população. A extrema direita continua na ofensiva e o PT não conseguiu estabelecer relações com os trabalhadores pobres das cidades.

Houve uma decisão consciente do governo de que Lula não participar das eleições para não trombar com o centrão. Isso diminuiu a capacidade de disputa do PT. A escolha foi pautada no medo da repetição dos conflitos que culminaram com a violenta deposição de Dilma. Estratégias baseadas no medo raramente são vitoriosas na esquerda. Esta estratégia fracassou e enfraqueceu a esquerda e o PT na disputa das eleições de 2024 e deixou uma percepção de derrota (em vários casos real e outras nem tanto) na maior parte da militância e dos apoiadores.

A forma tradicional de disputar eleições, com a força do poder financeiro, não foi mitigada com o financiamento público de campanhas. E é preciso dizer que o financiamento público, uma conquista social importante, não foi tratado pela direção nacional da forma democrática que necessitávamos. O manejo da distribuição dos recursos pela Executiva Nacional e especialmente pela Tesouraria Nacional do PT foi marcado pelo centralismo, desqualificação, autoritarismo e falta de visão da disputa no país.

Uma avaliação crítica na próxima reunião do DN é urgente e necessária. No cenário estadual, a definição política de distribuir recurso do FEFC para todas as candidaturas foi correta, no entanto a operacionalização ocasionou prejuízos por conta da burocracia bancária, do desconhecimento do sistema FEFC e das datas limites para envio de recursos para candidaturas femininas, dos erros de preenchimento dos requerimentos por parte dos candidat@s. Os prejuízos se acumularam para uma parte das candidaturas, especialmente as femininas, mas a principal queixa é o pouco ou quase inexistente retorno por parte da direção dos questionamentos angustiados dos candidat@s e d@s dirigentes municipais. A direção, e me incluo nesse processo, poderia e deveria dar uma resposta melhor a essa angústia.

Mas é preciso dizer que não seria o fundo eleitoral que nos salvaria dessa realidade de uma disputa desigual com aqueles que foram financiados por meios antidemocráticos, como as emendas do orçamento secreto ou outros recursos de origem criminosa. Essa forma burguesa de fazer eleição não será contraposta com financiamento público. Para derrotar o poder financeiro da compra de votos na eleição, é necessária muito mais organização social.

Por fim, três reflexões são importantes:

1 – A federação precisa acabar. Em muitas cidades, a federação foi um prejuízo para o PT, como no caso de Jacobina, onde a presidenta do PT saiu do partido para poder ser candidata, pois era mais bem posicionada nas pesquisas que o prefeito do PCdoB. O PT perdeu toda a bancada, pois o prefeito do PCdoB atuou para trazer para a chapa do PT pessoas com mandatos e com votação superior à dos nossos vereadores. E no final da eleição, a manutenção da candidatura do prefeito ocasionou a derrota da esquerda para a direita na cidade, ficando esse prefeito com menos de 20% dos votos, atrás da ex presidenta do PT que teve 36% dos votos.

2 – O governador, que reconhecidamente mais viajou e fez campanha em relação aos seus antecessores, aquele que mais esteve em palanques petistas, também foi o governador que mais fez campanha contra palanques em que o PT estava e mais triste ainda, o que mais fez campanha contra palanques em que o PT tinha a candidatura a prefeit@. Essa movimentação por vezes errática e por vezes incompreensível, trouxe prejuízos ao partido. É preciso rever essa forma de atuação. Lugares onde retirar a candidatura do PT não significou que a base aliada (até então antipetista) tivesse sucesso na eleição, mas significou um grande desacumulo para o PT. Lugares onde a escolha de um palanque contrário ao do PT gerou apenas desgaste na base petista, sem acúmulo eleitoral. Essa forma de atuação teve grande impacto na militância do PT nas cidades que em grande medida se sentiu atraiçoada. Cabe a Jerônimo refazer as pontes com boa parte da militância do PT que está indignada e com raiva da atuação dele e do governo neste processo em uma gama de cidades pelo estado. Resta saber se ele acha isso importante

3 – Em Salvador, o partido precisa deixar de terceirizar para o governo sua decisão de estratégia e tática eleitoral. Na capital tivemos a conjunção de fatores estruturais: a despolitização, o vale tudo, a política baixa e a hipocrisia que culminaram numa derrota avassaladora na cidade.

Analisar essa tragédia vai além dos belos chavões como a culpa é da direção, não ouviram a base, a culpa é do governo e outras que tais, que em grande medida são verdadeiros, mas não captam o elemento central da crise do PT na cidade, nem apontam o caminho da reconstrução, são expressões de indignação e raiva, justificadas, diga-se de passagem, mas que não resolvem o problema. O PT Salvador viveu um ciclo de ascenso entre 1985 e 2012, com as candidaturas de Jorge Almeida, Zezeu Ribeiro, as várias de Pelegrino e a de Pinheiro, em que havia um processo de acumulação e disputa real da cidade. Tínhamos projeto e tínhamos nomes. Esse ciclo findou e não conseguimos nem construir um novo projeto para a cidade e obviamente nem construir nomes que pudessem levar esse projeto e disputar a cidade. Tal qual em nível nacional, em salvador, os novos atores sociais que emergiram nesse período de redesenho do capitalismo mundial, não estão no PT. Esse é um elemento estrutural da nossa crise.

A responsabilidade da direção partidária e dos governos está em não conseguir, ou não querer, iniciar uma política de construção de um novo ciclo de disputa na cidade. Em 2016, durante a crise aguda pós-golpe, quando afirmar o PT era vital, a política adotada pelo então governador Rui Costa, foi lançar a candidatura de Alice Portugal, do PCdoB. Com todo o respeito à militância e à trajetória da companheira e do partido, ela não tinha condições de estruturar um novo ciclo de disputa na cidade.
Em 2020, houve a tentativa de enxertar uma candidatura que não tinha qualquer remota identificação com o partido e lançar Belintani como candidato do PT, que foi interrompida pela resistência da militância do partido em Salvador. No entanto, o governo impôs, e a maioria da direção partidária municipal aceitou, o nome da major Denice, não com o intuito de iniciar um novo ciclo de disputa, mas por ser um nome que, se tivesse sucesso, deveria sua trajetória política ao então governador. Apesar de certo preconceito dentro do PT contra a major Denice, ela foi muito correta com o partido e sua militância, dentro dos limites que lhe foram impostos. O fracasso eleitoral foi muito mais responsabilidade de outros do que dela. O resultado foi o isolamento da candidata após a derrota eleitoral.

Sem resolver nenhum problema e criando outros, rumamos para as eleições de 2024 com uma posição definida “por quem mandava”: terceirizar a eleição de Salvador e entregar a cidade e por tabela a Região Metropolitana e o Recôncavo, construindo a maior derrota do PT na cidade desde 1985.
A disputa se daria entre o “candidato” de Rui, o ex-vereador Trindade, turbinado pelo comando da CONDER, e o “candidato” de Wagner, o Geraldinho. Essa estratégia desastrosa de entregar a eleição de Salvador por W.O. permitiu a direita e extrema-direita concentrar recursos humanos e materiais na Região Metropolitana, no Recôncavo e nos grandes colégios eleitorais do estado. O resto, todos já sabemos como aconteceu.

O lançamento da candidatura do companheiro Robinson nos animou bastante, pois tornava possível a construção de uma alternativa para o futuro. Porém, era fato conhecido que a candidatura não existiria, a não ser que fosse a candidatura do governo.

Outro elemento dessa tragédia foi o esfacelamento da direção municipal do PT. O oportunismo de algumas forças políticas se destacou — vale lembrar que algumas figuras fizeram discursos combativos e manifestaram total apoio a Trindade, depois a Geraldo Júnior e, mais tarde, a Kleber Rosa, sem demonstrar nenhum constrangimento. A despolitização, a raiva, o envolvimento de diversos candidatos e vereadores com nossos adversários, o “vale tudo” e a completa perda da disciplina partidária são todos sintomas da grave crise que o PT de Salvador enfrenta.

O partido precisa voltar a oferecer projeto e quadro político à capital. Por três eleições, o partido tem permitido que a opinião do governo seja a única levada em conta. Para isso, não é preciso de partido.

A derrota de 2024 foi a maior de todas. Sair de 4 vereadores para 1, ver a candidatura do governo em terceiro lugar e ver um quantitativo grande de dirigentes descumprindo publicamente a decisão do PT é o fundo do poço. O segundo e o terceiro candidatos mais votados do PT fizeram mais de 6 mil votos, mas isso não foi suficiente para eleger. Só resta agora sair desse poço ou continuar o definhamento político e eleitoral do partido na cidade. Nossos adversários estão felizes, e nossos aliados não lamentaram esse resultado. A nós, só resta a reconstrução ou a capitulação.

Respostas de 2

  1. Em busca de vitórias vejo o PT se perder, perder sua identidade, sua história, isso é lamentável. Acordos expúrios, coligações com o inimigo, eleição de petistas que não sabem o que é ser petista, estamos numa encruzilhada e precisamos urgentemente decidir se queremos continuar a ser o PT ou se seremos apenas mais um partidinho de centro que balança ao sabor do vento.

  2. Lamentável a situação da Bahia. Duro é saber ué no resto do país a situação não é muito diferente. No Piauí a derrota foi acachapante tb. São estados governados pelo PT mas sem a cara do PT. Não existe mais o jeito petista de governar. Escolas cívico-militar, privatização de setores estratégicos:
    Energia, saneamento básico etc. mostra os desvios do partido para a direita. O projeto do PT não tem tais desvios.
    Sem falar na entrada de liberais, de oportunistas ué só usam o partido. O PT precisa urgente se recompor senão perderá a base histórica inclusive que sempre apoiou Lula. O governo federal está trilhando um caminho preocupante. Ou Lula dá freio no neoliberalismo de Haddad ou vai colocar sua pp história e popularidade na lata do lixo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Virtual personal assistant from Los Angeles supports companies with administrative tasks and handling of office organizational issues.